Quando olho para trás, não lembro que fui eu que escrevi.

Quando olho para trás, não lembro que fui eu que escrevi.

Lembrei que hoje tinha tempo para escrever. Tempo para fazer uma coisa que me dá prazer, sem recompensa, sem obrigação, sem me obrigar a aprender nada mais do que aquilo que já sei. Parece que foi anteontem a última vez que o fiz, e o meu anteontem foi há três anos atrás. Isso quer dizer 3 x 365 dias, 26280 horas. Isso foi o meu anteontem. Isso foi a última vez que me dei ao prazer de escrever só porque sim. Há alguma coisa de muito errado comigo, e cheira-me que vou descobrir brevemente o quê.

Vida morta…

Quando a vida é muito pouco. Quando a morte é muito mais. Quando a morte nos rouba os sonhos, os planos, as alegrias, quando a morte nos rouba o amor. Quando a morte nos rouba um amigo, um marido, um pai. Quando a morte nos rouba, e ainda que a nossa vida possa continuar, não é mais a mesma vida. Não existem sonhos, nem planos nem alegrias, com um defunto. A morte só nos deixa recordações. Deixa-nos a lembrança que a vida é muito pouco. Quando a morte rouba a vida que é a nossa vida, mata-nos também. A morte é muito mais.

Sim, eu sei…

Uma dia entendes que de tudo o que vives ficam as recordações. Engraçado… eu que sempre me considerei despegada a cada dia que passa encontro mais recordações do que as que esperava. Não sabia que guardava tantas coisas dentro de mim. Mas sempre que ouço a alma, lá estão elas gritando. Fazem-me querer chorar. Fazem-me sorrir. Uma das melhores personagens da minha vida, apareceu do nada, numa situação completamente surreal, onde eu nunca deveria ter estado. Mas apareceu e ficou. Por pouco tempo, e para sempre. Ensinou-me que afinal não corro sempre atrás do que quero, às vezes corro com medo do que sinto…que afinal não sou a miúda que tem sempre resposta para tudo, mas a quem só faltam respostas. E hoje por entre o bau das recordações, descubro que ainda estou a aprender com cada uma dessas lições, no meio de tudo isto encontro saudades. E milhares de quilometros de distância.

…músicas…

Um dia fizeram-me, por algum motivo não relevante de ser referenciado, ouvir uma música. Muito provavelmente devido ao excessivo volume em que sempre se encontra o meu computador e à peculiar voz de quem a canta, não lhe prestei atenção. A atenção suficiente. Hoje, por outros motivos que também não carecem de explicação voltei a ouvir. Com o som ligeiramente (…) mais baixo porque cá em casa, e não fosse uma casa situada em território espanhol, há quem faça a sesta. Voltei a ouvir, com atenção. A atenção suficiente. Há quem diga que coincidências são coincidências e se não forem passam a ser sinais, sobre isto não me pronuncio. Mas, no entanto e não tivesse eu sempre uma palavrinha a dizer, engraçado puder percebê-la agora. Porque sim. Definitivamente um dia quero uma casa num pomar, ou junto ao mar. Largar tudo, nunca ter frio nem fome. Mas, não estou preocupada.

Chamem-lhe o que quiserem…

… eu chamo-lhe mania, mania de sorrir quando só me apetece chorar. Mania de esculpir uma dura casca onde se esconde toda a sensibilidade que não pode ser ferida. Nem tudo o que reluz é ouro. Nem tudo o que parece é. Vocês podem dizer o que quiserem, eu digo que as lágrimas são definitivamente menos importantes que os sorrisos. Escondo-me numa dura casca. Mas não sou uma casca dura.

Como seria se…

Como teria sido a minha vida se…

É inegável, ponderamos demasiadas vezes o ” e se”, não no sentido de decisões futuras, que nestas devemos questionar a nós próprios o que poderá acontecer se ficarmos, se formos, se estivermos, se aceitarmos, se cedemos, se gostamos, se é esse o passo que queremos mesmo dar, cada vez se torna mais importante ter os pés em terreno firme. Mas é quando perguntamos depois, por decisões passadas, e se eu tivesse feito assim? e se eu tivesse ido? se tivesse aceitado, se nao estivesse ali naquele momento? que o terreno começa a ficar perigoso.

Somos feitos das decisões de cada dia, e se tivessemos tomado uma em vez da outra hoje mesmo, nós não seriamos nós, mas uma outra pessoa dentro do mesmo corpo. Pessoas dizem que nunca se arrependeram de nada do que possam ter feito e nunca mudariam nenhuma das suas escolhas, outras dizem que se arrependem, mas que se fosse possível mudariam o caminho que tomaram em determinadas situações. Ainda há algumas que como eu se arrependem de muita merda que fizeram, que se o seu génio lhes permitisse fariam diferente, mas que sabem que nunca existem duas escolhas para uma mesma opção. O passado já lá está, errar, não errar, arrepender-se ou não é apenas a nossa opinião actual. Nunca poderemos voltar atrás para mudar o que foi feito. Entrar em retrospectiva da ilusão daquilo que poderiamos ter sido, só serve para nos afastar momentaneamente daquilo que somos.

Somos erros, somos arrependimentos, somos aprendizagens e realizações, somos tristezas e alegrias, somos quem magoou e foi magoado, somos quem fez chorar, quem chorou, quem cresceu, somos quem vive o hoje à custa da nossa vontade. Devemos trabalhar os defeitos, pedir perdão por erros, pintar com as nossas cores, descobrindo a essência.  Então não nos vale de nada perguntar sobre como teria sido a nossa vida se outro caminho tivessemos tomado, mesmo que estejamos no fundo do poço, porque  senão usares as forças para subir à tona, esquece, nem vais poder ouvir os outros dizerem “como seria a vida dela se…” não caisse.

Sobe à tona e poderás ponderar “Como será a minha vida se, não voltar a meter tantas vezes a pata na poça, ou no poço…”

Sou o próprio mar…

Reflecte, pensa em ti e nos teus semelhantes e encontrarás a paz da alma…

Penso em  mim? Sim. E nos meus semelhantes? Quem? Procuro semelhanças e afinidades, faço uma busca infinita e encontro. Sou semelhante. Sim, semelhante ao mar, a pouco e pouco nos tornamos mais profundos, em todas as mudanças conservamos a unidade, devolvemos os cadáveres à praia. Nunca podia ser só um rio que quando se une ao mar perde o seu próprio nome e a sua doçura. Sou o próprio mar. Sou um reservatório de todos os meus caminhos, minhas emoções dos percursos da minha água e da chuva das nuvens, não transbordo nem seco nunca. Estou no meio de milhões de pessoas, como gotas de àgua ou flocos de gelo, não aumento nem diminuo, sou do tamanho exacto da minha vontade. Como o mar salgado, apenas tenho um sabor, o da liberdade. Estou cheia de pedras preciosas, tesouros e pérolas e sirvo de morada a uma poderosa existência, a alma. Não faço distinção de quem tomar, com quem partilhar, seja nobre ou vulgar. Sou semelhante á agua que apaga todas as nódoas, todos os fogos e que purifica. Não sou semelhante. Sou o próprio mar. Sou a minha doutrina. Da água vieste, para a àgua tornarás. E encontro, paz e liberdade da alma, dentro de mim, dentro do mar.